Fazer o seu próprio pãozinho ao
lado da Chica, copiando-a fielmente a amassar, esmurrar com os nós dos dedos e benzer
a massa, depois esperar ansiosa que o forno a lenha o coza, detectá-lo no meio
dos pães grandes na pá e orgulhosa apresentá-lo na mesa do lanche.
Fazer o seu próprio queijo fresco,
à frente da Chica, apertando com vagar o leite coalhado para sair o soro, colocar
o cincho, polvilhar de sal grosso e apresentá-lo à mesa do jantar.
Migar couves para as galinhas, sentada
numa cadeirinha com um alguidar entre as pernas, e misturar depois com o
farelo.
Regar a horta com o Adriano
Lourenço, marido da Chica, dos homens mais fascinantes que conheci. Não sei se
tinha a 4ª classe, mas adorava Camilo Castelo Branco e tinha lido todos os seus
livros. Um poço de sabedoria sobre tudo o que tinha a ver com jardins e hortas
e bichos e histórias e Camilo.
Ver a água a precipitar-se nos
regos da horta. Controlar a quantidade, rápidamente tapar o caminho com a
enxada e abrir a entrada de outro rego, numa sensação eufórica de poder e
controlo absoluto.
Ir aos figos, com as recomendações
proverbiais: têm de ter capa de pobre, pescoço de donzela e lágrima de viúva!
Ir às amoras de cestinha no braço,
e comer mais do que as que se apanharam.
Ir aos medronhos mais que maduros,
ao sol, em Agosto, apesar da proibição.
Apanhar marmelos para fazer
marmelada e comer um, bem adstringente, pelo caminho.
Escolher arroz, descascar ervilhas,
depenar galinhas, untar os queijos com azeite, envolvê-los em palha e pô-los
numa talha de barro.
Ir à fonte e beber de um cocho a
água gelada mesmo de Verão.
Andar a cavalo. Galopar na
charneca, sózinha.
Ir de bicicleta a todo o lado. Observar
as ovelhas, as marrãs, as vacas.
Construir uma jangada para a
barragem, com câmaras-de-ar gigantes roubadas ao tractor ou à ceifeira, tábuas
e cortiça.
Escolher uma cana-da-índia,
arranjar fio, chumbada, anzol e miolo de pão e ir pescar achigãs à barragem. Pescar um achigã e o primo, com cana de pesca à séria, não pescar nada.
Montar castelos com fardos de
palha um em cada ponta do gigantesco celeiro, trepar até ao cimo e depois atirar os fardos
para o castelo dos outros, mesmo com o risco da brotoeja certa.
Pequena amostra do que não se esquece.
LINDO LEONOR. PATRIMONIO MARAVILHOSAMENTE DESCRITO. VALOR IMENSO NA MEMORIA DO CORAÇAO QUE NINGUÉM JAMAIS TIRA DE NÓS. VOU LEVAR E PUBLICAR NO MEU BLOG. BEIJOS TODOS.
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