terça-feira, maio 17, 2011

Eles, o país deles, eu e o meu país

O país deles é uma gruta, cuja porta gigante, uma beleza esculpida há séculos em estilo manuelino, não lhes desperta qualquer interesse senão porque se pode abrir, à voz de uma senha fornecida pelo primeiro deles há já bastantes anos.
Nessa gruta havia muitos tesouros, de toda a espécie. Baús e baús de ouro, jóias e quadros, em cujas tampas estavam inscritas delicadamente, a tinta da china, “honra”, “palavra”, “honestidade”, “justiça”...
Veio o primeiro, o que descobriu a senha por tortuosos caminhos, depois um segundo, e pouco a pouco foram sendo cada vez mais e serviram-se...
Abruptamente arrancaram as tampas da justiça e honestidade e retiraram o ouro. Com pés de cabra violentaram as da honradez e da palavra e carregaram as jóias. Tudo saquearam, mas eles não têm remorsos.
O país deles não tem pessoas, vidas, almas. Tem números, negócios e interesses.
Eles acham-se pastores de ovelhas, mas são eles afinal as alcateias que as devoram.

O meu país é um Reino. Povoado de gente, vidas e almas.
Gente boa, justa e honesta, com honra e palavra.
Como o taxista que agora faz horário nocturno para ajudar a filha a pagar a casa, porque foi despedida. Como aquele que abdicou da maçã do seu farnel, só para que provasse uma verdadeira maçã portuguesa. Como as velhinhas que se levantam para dar lugar a outras velhinhas.
O meu país é História e histórias, cheiros, sons, memória e a alma dos seus.
O meu país é pacífico e ordeiro, mas também aventureiro quando quer. E pega a adversidade de caras, sobrevive e cresce.

Mas a cada dia que passa o meu país é mais o país deles.

Quero o meu país de volta, com seus baús intactos.
Quero fechar a porta da gruta e mudar a palavra passe para que ninguém mais se sirva.

Leonor
17/05/11

Lidos e vistos


Muito bons, ambos!