terça-feira, março 22, 2011

Pai

Há uma fotografia da minha avó Tim (pequena mas extraordinária e corajosa mulher do nosso avô Hipólito Raposo) com os 6 netos da altura, tirada no Verão de 1964. 
O meu pai morreu nesse Verão. A 15 de Agosto.
Não se preocupe, pai, porque a mãe fez tudo para que estivesse presente. O pai era uma espécie de herói da mãe, e passou a ser o nosso herói. Em todas as oportunidades contava-nos histórias sobre o pai. Super inteligente, raiando a genialidade, com imenso sentido de humor, congregava em si quase todas as qualidades.
Únicos defeitos, mau génio e um zero à esquerda na arte do desenho. E logo tinham de calhar a mim, como única herança genética, essas facetas...
Sempre que podia, a mãe também nos proporcionava figuras que de alguma forma pudessemos sentir como paternais. O tio João, por exemplo, chamado à pressa para vir ralhar quando já nada resultava, o Vasco Vieira de Almeida, amigo do pai, que nos ia supervisionando, mais tarde o Jorge Sottomayor de Almeida...
Devia ser a única dos três com lembranças do pai, mas tenho poucas.
Lembro-me de coisas que fiz consigo.
Lembro-me de estar sentada à sua frente na garupa da égua garrana de Cinfães. É verdade que há fotografia, mas tenho memória física desse andar a cavalo.
Lembro-me de ir voar de avioneta. Da sala de espera do aeródromo, nem sei qual, e do “chão” da avioneta. Devia estar cheia de medo, para me lembrar do olhar para baixo.
E lembro-me da sua mão. Não me lembro da sua cara mas lembro-me da sua mão. Era muito importante, a sua mão. Grande e segura. E tenho a certeza que era a sua mão, porque a unha do polegar era diferente, e a mãe explicou que tinha sido pisada por um cavalo.
Parece que é pouco, mas para mim é tudo.
Lembro-me da mão do meu pai.

Lisboa, 19 de Março de 2011

(Soube depois que a fotografia que me levara a escrever o texto tinha sido tirada em Setembro, exactamente aquando da missa pelos trinta dias da morte. Não está aqui por razões óbvias.)

sábado, março 05, 2011

Direito de resposta de uma superficial aterradora a um Senhor Doutor


Foi assim, de uma aterradora superficialidade, que foram por si classificados os antagonistas do acordo ortográfico, mesmo que interpondo a palavra habitualmente, para acautelar algumas posições mais...profundas.
Sim, eu superficial me confesso, mas ainda assim quero exercer o direito à minha superficial resposta, até porque uma superficial também tem direito à vida, mesmo que...superficial.

E pretendia exercê-lo de uma forma interrogativa, porque assim vai o meu estado de alma.

  • Se até agora, e durante alguns séculos, os portugueses liam livros de escritores brasileiros e vice-versa (esta superficial acabou de ler a “A maçã no escuro” da Clarice Lispector, mas como é superficial demorou algum tempo, claro!) e nunca se queixaram, qual foi a verdadeira razão invocada para a necessidade de um acordo?
  • Algum editor brasileiro deixou de publicar livros de escritores portugueses, ou era feita uma “tradução”?
  • Se há brasileiros incapazes de ler livros de escritores portugueses, ao celebrar-se o acordo desta forma estamos a descer ao nível? Não devíamos antes elevá-lo?
  • Qual é a diferença para um brasileiro ler acto em vez de ato? Não é a fonética que funciona também na leitura? Eu, que não sei italiano, para ler nessa, para mim, atraente língua, tenho de ler alto... mas pronto, eu sou superficial.
  • Não se está a contribuir para uma cada vez maior existência de palavras homónimas?
  • Porque se esqueceram, ou melhor, se desprezaram, as raízes etimológicas? Evolução implica renegar passado?
  • Pretende-se, com o acordo, ganhar mais leitores? Não seria mais eficaz o investimento na educação?
  • Com o acordo deixa de haver liberdade de expressão? Não me posso exprimir sem ser através do diktat instituído (sou funcionária pública...)?
Acredito, como assumida superficial, que terá resposta a todas estas questões. Uma resposta muitíssimo inteligente (reparará que ainda escrevo à moda de um acordo anterior ao anterior acordo), e sinceramente espero que me convença. Duvido.

Como nota final apenas um pequeno reparo a erros ortográficos no seu texto, com acordo ou sem acordo, com certeza devidos à emoção com que quer expor os seus argumentos. Nem reparei.

Em tempo: adorei ler “Os desastres de Sophia”, e todos os livros da Condessa, em edição encadernada,com gravuras da época, e nunca pensei que continham erros...

quarta-feira, março 02, 2011

Esboço de análise sociólogica dos Monárquicos

Categorias detectadas:

Monárquicos militantes
Monárquicos ideólogos
Monárquicos envergonhados
Monárquicos disfarçados
Monárquicos em busca do título perdido
Monárquicos anarquistas
Monárquicos integralistas
Monárquicos liberais
Monárquicos absolutistas
Monárquicos constitucionalistas
Monárquicos genéticos
Monárquicos estéticos
Monárquicos surreais
Monárquicos porque sim

As categorias não são estanques, há quem se encaixe em várias e até em todas (dependendo do ambiente circundante...)

Nota: isto é apenas uma brincadeira. Mas podem avançar com as críticas brutas, a esta bruta em tratamento de recuperação de brutodependente...